Após meses sob pressão, Fed corta juros pela 1ª vez no governo Trump
Na sexta reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve (Fed, o Banco Central norte-americano) desde a posse do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, as expectativas do mercado foram confirmadas e a taxa básica de juros finalmente foi reduzida pela autoridade monetária.
O corte nos juros foi de 0,25 ponto percentual, acompanhando a maioria das projeções dos analistas do mercado. Agora, os juros estão no patamar entre 4% e 4,25% ao ano.
A votação não foi unânime. Stephen Miran, novo integrante do Fed, indicado por Donald Trump, votou por um corte maior, de 0,5 ponto percentual.
O que aconteceu
- Nesta quarta-feira (17/9), o colegiado anunciou a redução dos juros básicos da economia norte-americana em 0,25 ponto percentual. Com isso, a taxa agora se situa no intervalo de 4% a 4,25% ao ano.
- Antes de cortar os juros, o BC dos EUA manteve a taxa inalterada por cinco reuniões consecutivas.
- Este foi o primeiro corte de juros nos EUA sob o governo de Donald Trump, que teve início no dia 20 de janeiro de 2025.
- Antes de Trump assumir a Casa Branca, o Fed tinha levado a cabo um ciclo de três quedas consecutivas dos juros nos EUA, que começou em setembro do ano passado.
- Desde então, o BC norte-americano sempre deixou claro que era necessário manter a cautela e analisar cuidadosamente os indicadores econômicos para tomar suas decisões de política monetária.
O que diz o Fed
“Ao considerar ajustes adicionais na meta para a taxa básica de juros, o comitê avaliará cuidadosamente os dados recebidos, a evolução das perspectivas e o equilíbrio de riscos. O comitê continuará reduzindo suas participações em títulos do Tesouro, títulos de dívida de agências e títulos lastreados em hipotecas de agências. O comitê está fortemente comprometido em apoiar o emprego máximo e retornar a inflação à sua meta de 2%”, diz o Fed no comunicado que acompanha a decisão.
“Ao avaliar a postura adequada da política monetária, o comitê continuará monitorando as implicações das informações recebidas para as perspectivas econômicas. O comitê estará preparado para ajustar a postura da política monetária conforme apropriado, caso surjam riscos que possam impedir a consecução dos objetivos do comitê”, prossegue o Fed no comunicado.
“As avaliações do comitê levarão em consideração uma ampla gama de informações, incluindo leituras sobre as condições do mercado de trabalho, pressões inflacionárias e expectativas de inflação, além de desenvolvimentos financeiros e internacionais.”
No comunicado, o Fed diz ainda que “o comitê busca atingir o máximo de emprego e inflação a uma taxa de 2% no longo prazo”. E alerta: “A incerteza quanto às perspectivas econômicas permanece elevada. O comitê está atento aos riscos para ambos os lados de seu duplo mandato e avalia que os riscos negativos para o emprego aumentaram”.
Inflação nos EUA
A taxa básica de juros é o principal instrumento dos bancos centrais para controlar a inflação. Quando a autoridade monetária mantém os juros elevados, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
Segundo dados do Departamento do Trabalho, a inflação nos EUA ficou em 2,9% em agosto, na base anual, ante 2,7% registrados em julho. Na comparação mensal, o índice foi de 0,4%, ante 0,2% em julho.
A meta de inflação nos EUA é de 2% ao ano. Embora não esteja nesse patamar, o índice vem se mantendo abaixo de 3% desde julho de 2024.
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O que significa para o Brasil a queda dos juros nos EUA
Analistas consultados pelo Metrópoles afirmam que o movimento da taxa americana tem forte impacto no Brasil. É provável que essa repercussão seja positiva, mas os riscos existem.
A lista de consequências, em linhas gerais, inclui os seguintes pontos:
- Avanço da Bolsa: a tendência é de maior fluxo de capitais para ações, beneficiando setores ligados ao consumo e ao crédito.
- Câmbio: valorização do real frente ao dólar diante do maior diferencial de juros, embora riscos internos e externos sigam no radar.
- Inflação: com a tendência de queda do dólar, há menor pressão sobre os preços de diversos produtos como os que utilizam insumos importados.
- Renda fixa: oportunidade em títulos longos.
Análise
Segundo André Valério, economista sênior do Banco Inter, “os próximos dados do mercado de trabalho continuarão sendo decisivos para a condução da política monetária”. “O Fed ainda vê espaço para o mercado de trabalho deteriorar, antecipando uma taxa de desemprego de 4,5% esse ano, enquanto vê a inflação a 3% esse ano e 2,6% em 2026, acima da projeção de junho”, observa.
“Portanto, caso vejamos uma reversão na tendência do mercado de trabalho, com uma eventual retomada do emprego, será difícil para o comitê justificar novos cortes. Até a reunião de outubro, teremos a divulgação de mais um ‘payroll’. Caso ele venha em linha com as últimas duas divulgações, teremos mais um corte de 0,25 ponto percentual”, projeta o economista.
Para Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad, “a decisão foi mais baseada em equilíbrio de riscos, citando o enfraquecimento do mercado de trabalho, mas mantendo o posicionamento e o comprometimento de buscar a meta de inflação em 2% ao ano”.
Thiago Calestine, economista e sócio da Dom Investimentos, avalia que o Fed tomou essa decisão “porque está olhando tanto para dados de inflação quanto para dados de desemprego”.
“Fica claro que tomaram essa decisão, pelos modelos macro que eles utilizam, principalmente, com o objetivo de proteger o nível de pleno emprego da economia americana. Inclusive, o desemprego lá está subindo. Então, para frear um pouco esse arrefecimento do mercado de trabalho por lá, já era esperado um alívio de 25 pontos-nase na taxa de juros norte-americana”, explica.
“Para o final do ano, são esperadas, além da queda que tivemos hoje, mais duas quedas, totalizando três quedas até dezembro de 2025. E cada queda individual será de 25 pontos-base na taxa de juros.”
Powell já havia indicado corte de juros
O início do ciclo de cortes nos juros pelo Fed já havia sido indicado pelo presidente da autoridade monetária, Jerome Powell, no mês passado. Em sua fala no Simpósio de Jackson Hole, conferência anual nos EUA que conta com a participação de dirigentes do Fed, Powell falou abertamente sobre essa possibilidade.
“A estabilidade da taxa de desemprego e outras medidas do mercado de trabalho nos permitem prosseguir com cautela ao considerarmos mudanças em nossa política monetária. No entanto, com a política em território restritivo, a perspectiva básica e a mudança no equilíbrio de riscos podem justificar ajustes em nossa postura”, disse o presidente do BC dos EUA.
Trump declarou guerra ao Fed
Antes mesmo de tomar posse para seu segundo mandato na Casa Branca, Donald Trump já fazia críticas às decisões do Fed sobre a taxa de juros e defendia que os cortes fossem intensificados – o que ainda não havia ocorrido em seu atual mandato.
Já empossado presidente, em discurso durante o Fórum Econômico Mundial de Davos (Suíça), Trump disse que trabalharia para que os juros nos EUA caíssem “imediatamente”.
Em novembro, após a confirmação da vitória de Trump sobre Joe Biden nas eleições, o Fed justificou a diminuição no ritmo de corte de juros afirmando que “as perspectivas econômicas são incertas e o comitê está atento aos riscos”. Na ocasião, o nome de Trump não foi mencionado.
Em meados de abril, Trump subiu o tom contra o chefe da autoridade monetária, Jerome Powell, e cobrou a redução da taxa de juros no país. “Os preços do petróleo caíram, os alimentos estão mais baratos e os EUA estão enriquecendo com as tarifas. O ‘atrasado’ já deveria ter reduzido as taxas de juros, como o BCE [Banco Central Europeu] fez há tempos, mas com certeza deveria reduzi-las agora. A demissão de Powell não pode vir rápido o suficiente”, afirmou.
No início de junho, Trump voltou a cobrar a queda dos juros e criticou Powell. Em declarações dadas durante um evento na Casa Branca, Trump negou que tivesse a intenção de demitir o presidente do Fed, mas criticou novamente o chefe da autoridade monetária e insinuou que pressionaria pelo corte dos juros.
Na semana anterior, o presidente dos EUA havia recebido o chefe do Fed para uma reunião na Casa Branca, em uma iniciativa interpretada como uma tentativa de pacificar a relação entre os dois.
Em julho, Trump voltou a criticar Powell. “As famílias estão sendo prejudicadas porque as taxas de juros estão muito altas e até mesmo o nosso país está tendo de pagar um juro mais elevado do que deveria por causa do ‘atrasado’”, escreveu Trump em sua rede social, a Truth Social.
No início desta semana, dias antes do anúncio do Fed, Trump voltou a criticar o presidente do Fed e o chamou de “incompetente”.
Trump prepara sucessão de Powell no Fed
A diretoria do Federal Reserve é composta por sete integrantes que cumprem mandatos de 4 a 14 anos – todos são indicados pela Presidência dos EUA. A indicação para o cargo de presidente do Fed é definida pela Casa Branca e confirmada por uma votação no Senado norte-americano a cada 4 anos.
Em 2022, Jerome Powell foi indicado pelo então presidente dos EUA, Joe Biden, para um segundo mandato à frente do Fed – que termina em maio de 2026.
Há algumas semanas, em conversa com jornalistas na Casa Branca, Trump revelou quais são os principais favoritos à indicação para suceder Powell à frente do Fed. Segundo o presidente norte-americano, disputam a vaga o ex-diretor do Fed Kevin Warsh, o atual diretor Christopher Waller e o chefe do Conselho Econômico Nacional dos EUA, Kevin Hassett.