Argentina: Milei busca socorro junto a Trump para salvar economia

Os presidentes Javier Milei e Donald Trump se reúnem nesta terça-feira (23/9), em Nova York (EUA), para definir uma ajuda financeira dos Estados Unidos que contenha a corrida cambial contra o peso argentino e o risco de um novo calote da dívida argentina. A promessa de um “salva-vidas” para o plano econômico de Milei fez os mercados darem um respiro ao Banco Central argentino que tem perdido reservas aceleradamente.

O governo argentino também anunciou a eliminação transitória do imposto sobre a exportação de grãos, cereais e carnes, para incentivar os exportadores a ingressarem divisas no país. A dúvida é se os anúncios serão suficientes para evitar a desvalorização do peso argentino antes das eleições legislativas de 26 de outubro.

A expectativa dos mercados é pelas definições sobre qual será o “socorro financeiro” dos Estados Unidos para a Argentina. Já a oposição teme as consequências para a Argentina em troca do “salva-vidas”.

Desta vez, não é o Fundo Monetário Internacional, mas diretamente o Tesouro dos Estados Unidos que está salvando um país — algo que não acontecia desde 2002. Na época, Washington concedeu ao Uruguai um empréstimo de US$ 1,5 bilhão para ajudar o país a enfrentar uma grave crise bancária e econômica.

Milei se reúne com Trump à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas. Após o encontro entre os dois aliados ideológicos, são esperados mais detalhes sobre como será essa ajuda salvadora: montante, condições e exigências dos Estados Unidos.

Depois, Milei se reúne com a diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva. O presidente argentino terá de explicar por que não acumulou reservas no Banco Central durante o primeiro semestre, quando o setor agropecuário ingressou no país as divisas das principais exportações. Eventuais ajustes no atual programa econômico só virão depois das eleições.

No ano que vem, a Argentina tem dois vencimentos consideráveis da dívida, por um total de US$ 8,5 bilhões (US$ 4 bilhões em janeiro; US$ 4,5 bilhões em julho). Acredita-se, por isso, que a ajuda dos Estados Unidos seja em torno de US$ 10 bilhões, para evitar qualquer dúvida sobre um calote que volta ao horizonte da economia argentina, que segue estagnada.

Urgência financeira

Na semana passada, o Banco Central argentino vendeu US$ 1,1 bilhão para conter a corrida cambial contra o peso. O montante é considerado alto para a economia argentina. Só na sexta-feira (19/9), foram US$ 678 milhões – uma das maiores vendas dos últimos 25 anos.

Nas últimas horas, o governo anunciou a eliminação transitória do imposto sobre as exportações de grãos, cereais e carnes, chamado de retenções agropecuárias, implementado há 23 anos. É a galinha dos ovos de ouro do fisco argentino. As exportações de soja, por exemplo, deixam 26% do que vendem. Até o começo do ano, eram 33%.

Até o dia 31 de outubro – cinco dias após as eleições – ou até os primeiros US$ 7 bilhões, o governo não vai cobrar essas retenções como forma de incentivar os exportadores a ingressarem divisas no Banco Central. Isso mostra o desespero do governo por ter dólares suficientes para conter uma corrida cambial contra o peso, mesmo que a urgência comprometa o equilíbrio fiscal.

Além disso, como um sinal para os credores de que a Argentina não corre risco de reestruturar a dívida ou de dar um calote, o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, divulgou uma nota na qual afirmou que “a Argentina é um aliado sistemicamente importante dos Estados Unidos” e que “o Departamento do Tesouro está disposto a fazer o que for necessário para apoiar a Argentina”.

Ele acrescentou que as opções são três: um “swap”, isto é, uma troca de divisas com o Banco Central argentino; também a compra direta de divisas ou a compra de dívida pública argentina em dólares.

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No dia 15 de abril, Scott Bessent esteve em Buenos Aires, prometendo “pleno apoio dos Estados Unidos às audazes reformas econômicas” do presidente Milei. Logo depois das palavras do secretário norte-americano, Milei agradeceu a Bessent e a Trump “pelo apoio incondicional ao povo argentino”.

A oposição a Milei questiona se será mesmo incondicional ou se haverá exigências. O secretário do Tesouro garante que Washington não vai impor nenhuma condição. Mas a desconfiança é grande: os adversários veem uma manobra eleitoral e advertem sobre os riscos geopolíticos de uma dívida com um país, e não com um organismo internacional de crédito. Surgem teorias sobre a exigência de terras raras, como no caso da Ucrânia, ou de controle do Estreito de Magalhães contra a China, como no caso do Canal do Panamá.

Mercados invertem a tendência

Depois de duas semanas de uma corrida cambial, imediatamente após as palavras do secretário do Tesouro dos Estados Unidos, o dólar começou a recuar ante o peso argentino, fechando com uma queda de 5,6%. O peso argentino se valorizou 2,5% em relação ao euro.

A Bolsa de Buenos Aires subiu 7,5%, com ações que se valorizaram 25%. A taxa de risco-país caiu 25,6%, fechando em 1.083 pontos-base. Em Wall Street, as ações de empresas argentinas se valorizaram em até 20%.

Há um porém: com a eliminação transitória do imposto sobre as exportações, o Estado argentino deixa de arrecadar, comprometendo o superávit fiscal de 1,6% do Produto Interno Bruto, negociado com o FMI.

O custo fiscal da perda dessa receita é calculado entre 0,25% e 0,28% do PIB. Esse é o custo que o governo diz que teriam leis que o presidente Milei vetou, para atualizar o orçamento destinado aos portadores de deficiência, aos universitários ou aos médicos pediatras.

Economia em agonia

A Argentina procura um empréstimo salvador para blindar o peso argentino e, consequentemente, o plano econômico de Milei, que há tempos tem dado sinais de esgotamento.

A derrota eleitoral de 13,6 pontos na província de Buenos Aires (40% dos eleitores do país), em 7 de setembro passado, detonou uma corrida cambial contra o peso argentino, artificialmente valorizado desde que Milei assumiu a Presidência. O pleito antecipou o pior cenário, que nenhuma sondagem previu. Mostrou que chegou ao limite a paciência social com o ajuste fiscal de 5 pontos do PIB.

O empréstimo de US$ 20 bilhões do FMI, em abril (desembolsados US$ 14 bilhões), não foi suficiente para garantir a estabilidade da moeda argentina. Milei ancorou a moeda argentina ao dólar como forma de conter a inflação, tornando o país um dos mais caros do mundo e perdendo competitividade.

Para evitar uma desvalorização que acelere a inflação, o Banco Central tem queimado o dinheiro do FMI. À medida que gasta o dinheiro para conter a corrida cambial, fica com menos dólares para pagar a dívida, fazendo a taxa de risco-país disparar.

Com a taxa de risco-país elevada (subiu de 700 a 1.500 pontos-base em poucas semanas), acabam-se as chances de a Argentina se financiar no mercado de capitais. Para frear a corrida cambial, o governo também aumentou a taxa de juros (tocando os 80% ao ano), paralisando a economia, que não cresce desde abril. O país está a ponto de entrar, oficialmente, em recessão. Para frear o ataque dos mercados, a Argentina precisa agora de mais dinheiro. Mais dinheiro emprestado, mais dívida.

O círculo vicioso expõe a fragilidade de um plano econômico que se esgotou, mas que precisa ser esticado até as eleições legislativas de 26 de outubro, como forma de o governo ter chances eleitorais. É a economia submetida à sobrevivência política.

Uma desvalorização descontrolada do peso argentino teria impacto direto no aumento de preços – principal bandeira política do presidente Milei, que não consegue baixar a inflação dos 2% mensais.

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