Cerco judicial a Bolsonaro. Saiba quais ações o ex-presidente responde

O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) terá início nesta terça-feira (2/9) no Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-chefe do Palácio do Planalto é réu por cinco crimes e, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), figura como líder da organização criminosa responsável pela tentativa de golpe de Estado.
Além da ação penal que apura a tentativa de golpe, Bolsonaro é alvo de outras investigações. Recentemente, a Polícia Federal (PF) indiciou o ex-presidente e seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), pelos crimes de coação no curso do processo e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático.
Bolsonaro também foi indiciado no caso das joias sauditas, ainda em análise pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet. O episódio ocorreu quando uma comitiva do governo federal retornou de viagem oficial à Arábia Saudita com joias oferecidas por autoridades locais, sem declarar parte dos itens à Receita Federal.
O caso ganhou repercussão após o ex-ajudante de ordens Mauro Cid afirmar que vendeu joias da Presidência nos Estados Unidos a mando de Bolsonaro, entregando o dinheiro ao ex-presidente. Este inquérito, junto ao de coação, aguarda parecer da PGR, que poderá apresentar denúncia ou pedir arquivamento.
Outro inquérito contra Bolsonaro no STF tratava da fraude em seu cartão de vacina da Covid-19. Em março deste ano, o ministro Alexandre de Moraes determinou o arquivamento da investigação. Atualmente, são apenas dois os inquéritos em tramitação na Suprema Corte relacionados ao ex-presidente.
Decisões em outros tribunais
No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Bolsonaro foi declarado inelegível por oito anos, em decisão tomada em junho de 2023. Por maioria de votos (5 a 2), os ministros entenderam que o então presidente cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, ao convocar reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em 2022. Com isso, conforme critérios da Lei da Ficha Limpa, ele fica impedido de disputar as eleições de 2026.
Com o fim do mandato de Bolsonaro, o STF, em fevereiro de 2023 encaminhou dez pedidos de processo contra Bolsonaro a outras instâncias da Justiça, em sua maioria para o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) e para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).
Entre esses processos está o movido pela ex-presidente Dilma Rousseff por injúria, paralisado no TJDFT desde fevereiro do ano passado. Outro caso envolve a fala do ex-presidente no episódio “pintou um clima”, quando Bolsonaro foi condenado a pagar R$ 150 mil em danos morais por declarações sobre jovens venezuelanas.
Mais recentemente, Bolsonaro passou a ser investigado em inquérito da PF sobre fake news contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após relacionar o petista ao regime de Bashar al-Assad, na Síria, em contexto de execuções de pessoas LGBTQIA+. A Justiça ainda definirá se a apuração ficará a cargo da PF ou da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), conforme pedido do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).
Trama golpista
Na denúncia sobre a tentativa de golpe, o STF dividiu os acusados em quatro núcleos. Bolsonaro integra o núcleo principal, considerado o de liderança, ao lado de outros réus apontados como organizadores do plano para impedir a posse de Lula.
Para a PGR, Bolsonaro é o líder da organização criminosa, papel que agrava sua responsabilidade em caso de condenação.
A denúncia aceita pela Primeira Turma do STF o enquadra em cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O presidente da Turma, ministro Cristiano Zanin, reservou os dias 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro de 2025, das 9h às 12h, para sessões extraordinárias do julgamento. Também está prevista uma sessão extraordinária no dia 12, das 14h às 19h, além de sessões ordinárias nos dias 2 e 9, no mesmo horário vespertino.
O primeiro a votar será o relator, ministro Alexandre de Moraes. Recentemente, ele foi sancionado pelos Estados Unidos com base na Lei Magnitsky, em articulação que envolveu o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente. Moraes é o próximo vice-presidente do STF e integrará a presidência da Corte com o ministro Edson Fachin, em cerimônia prevista para o fim do mês.
Após o voto de Moraes, a palavra será do ministro Flávio Dino. Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Dino é ex-senador e ex-governador do Maranhão e ocupava o cargo de ministro da Justiça antes de assumir uma cadeira no STF.
Na sequência, votará o ministro Luiz Fux, considerado pelo núcleo bolsonarista como uma “esperança” para Bolsonaro, diante de posicionamentos recentes em questionamentos sobre a quantidade de depoimentos do ex-ajudante Mauro Cid, no âmbito da delação premiada firmada com a Polícia Federal (PF). Fux foi indicado pela então presidente Dilma Rousseff, em 2011.
Depois, será a vez da ministra Cármen Lúcia, a integrante mais antiga da Primeira Turma. Indicada por Lula, em 2006, ela é uma das magistradas mais longevas da história do STF, ficando atrás apenas do ministro Gilmar Mendes em tempo de atuação na atual composição da Corte.
O julgamento será concluído por Zanin, presidente da Turma. Ele é o ministro mais recente a chegar ao STF, nomeado em 2023 pelo presidente Lula. Para que haja definição no julgamento, é necessária maioria simples: três dos cinco ministros já são suficientes para firmar o entendimento, seja pela condenação ou absolvição dos réus.
Crimes imputados contra Bolsonaro e demais réus:
- Organização criminosa armada;
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Golpe de Estado;
- Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, com considerável prejuízo para a vítima (com exceção de Ramagem);
- Deterioração de patrimônio tombado (com exceção de Ramagem).
– Os crimes atribuídos a Alexandre Ramagem — deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado — foram suspensos por terem ocorrido após a diplomação, atendendo parcialmente ao pedido da Câmara dos Deputados.
Início das sessões de julgamento
A sessão de terça-feira (2/9) começará com Zanin abrindo os trabalhos, prosseguindo com Moraes na leitura do relatório da ação penal, que apresentará um histórico das investigações. Em seguida, falará o procurador-geral da República, Paulo Gonet, autor da denúncia contra os réus, pelo prazo de até duas horas.
Na sequência, as defesas apresentarão as sustentações orais, com duração de até uma hora cada. Concluída essa etapa, os ministros avaliarão as preliminares — questões levantadas e que precisam ser resolvidas antes do julgamento do mérito.
Logo após, Moraes terá a palavra para proferir seu voto, pela condenação ou absolvição dos réus. Na sequência, os demais ministros votarão, seguindo a ordem de antiguidade na Corte, e o julgamento será encerrado por Zanin.
As sessões ocorrerão no plenário da Primeira Turma do STF. A decisão da Corte será tomada por maioria. Caso haja condenação de Bolsonaro e dos demais réus, ela será anunciada na proclamação do resultado.
Confira os réus do núcleo crucial
- Alexandre Ramagem: ex-diretor da Abin, ele é acusado pela PGR de atuar na disseminação de notícias falsas sobre fraude nas eleições.
- Almir Garnier Santos: ex-comandante da Marinha, ele teria apoiado a tentativa de golpe em reunião com comandantes das Forças Armadas, na qual o então ministro da Defesa apresentou minuta de decreto golpista. Segundo a PGR, o almirante teria colocado tropas da Marinha à disposição.
- Anderson Torres: ex-ministro da Justiça, ele é acusado de assessorar juridicamente Bolsonaro na execução do plano golpista. Um dos principais indícios é a minuta do golpe encontrada na casa de Torres, em janeiro de 2023.
- Augusto Heleno: ex-ministro do GSI, o general participou de uma live que, segundo a denúncia, propagava notícias falsas sobre o sistema eleitoral. A PF também localizou uma agenda com anotações sobre o planejamento para descredibilizar as urnas eletrônicas.
- Jair Bolsonaro: ex-presidente da República, ele é apontado como líder da trama golpista. A PGR sustenta que Bolsonaro comandou o plano para se manter no poder após ser derrotado nas eleições e, por isso, responde à qualificadora de liderar o grupo.
- Mauro Cid: ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator do caso. Segundo a PGR, ele participou de reuniões sobre o golpe e trocou mensagens com conteúdo relacionado ao planejamento da ação.
- Paulo Sérgio Nogueira: ex-ministro da Defesa, ele teria apresentado aos comandantes militares decreto de estado de defesa, redigido por Bolsonaro. O texto previa a criação de “Comissão de Regularidade Eleitoral” e buscava anular o resultado das eleições.
- Walter Souza Braga Netto: é o único réu preso entre os oito acusados do núcleo central. Ex-ministro e general da reserva, foi detido em dezembro do ano passado por suspeita de obstruir as investigações. Segundo a delação de Cid, Braga Netto teria entregado dinheiro em uma sacola de vinho para financiar acampamentos e ações que incluíam um plano para matar o ministro Alexandre de Moraes.
As defesas dos réus do chamado núcleo crucial da trama golpista denunciada pela PGR ao STF apresentaram, em 13 de agosto, as alegações finais. A linha comum seguida pelos advogados dos oito réus foi frisar a falta de provas da acusação para ligar os respectivos clientes à participação no planejamento de um possível golpe de Estado.
O processo vai para julgamento da Primeira Turma, composta por Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Flávio Dino. Eles podem decidir se os oito acusados pela PGR serão condenados ou absolvidos. É possível, ainda, que algum ministro peça vista, o que representaria mais tempo para análise, com prazo de retorno para julgamento em 90 dias.