Cúpula da Celac: América Latina está balcanizada e dividida, diz Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou, neste domingo (9/11), da 4ª Cúpula Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos)-União Europeia, em Santa Marta, na Colômbia. Em seu discurso, fez um diagnóstico sobre a situação política da América Latina e Caribe, afirmando que a região está “balcanizada e dividida”.
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O encontro teve representantes de 33 países da América Latina e Caribe e 27 da União Europeia. Lula defendeu que a Celac e a União Europeia são centrais para a construção de uma ordem mundial baseada na paz, multilateralismo, e na multipolaridade.
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VINÍCIUS SCHMIDT/METRÓPOLES @vinicius.foto e Redes sociais
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva na plenária da Cúpula do Clima, em Belém.
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva na plenária da Cúpula do Clima, em Belém.
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Lula e Macron tiveram uma reunião em Belém
Ricardo Stuckert / PR
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Lula na COP30
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“A América Latina e o Caribe vivem uma profunda crise em seu projeto de integração. Voltamos a ser uma região balcanizada e dividida, mais voltada para fora do que para si própria. A intolerância ganha força e vem impedindo que diferentes pontos de vista possam se sentar à mesma mesa”, destacou Lula.
A ideia do encontro foi discutir, entre outras temas, a escalada nas tensões entre os Estados Unidos e Venezuela. Nos últimos meses, a Casa Branca tem intensificado a presença militar no mar do Caribe, sob justificativa de combater o narcotráfico na região.
O governo brasileiro defende uma saída pacífica para o conflito. Em reunião com Donald Trump, no final de outubro, Lula se colocou à disposição para mediar a disputa. Ele tem ressaltado que a América Latina é “zona de paz”.
Lula salientou que a América Latina voltou a conviver com o extremismo político, manipulação da informação e com o crime organizado.
“Estamos deixando de cultivar nossa vocação de cooperação e permitindo que conflitos e disputas ideológicas se imponham. Como resultado, vivemos de reunião em reunião, repletas de ideias e iniciativas que muitas vezes não saem do papel. Nossas cúpulas se tornaram um ritual vazio, dos quais se ausentam os principais líderes regionais”, disse o presidente do Brasil.
O mandatário brasileiro também abordou o acordo Mercosul-União Europeia, defendendo a aprovação na próxima cúpula do Mercosul, em dezembro. O presidente destacou que o instrumento integrará duas das maiores áreas de livre comércio, criando um mercado de 718 milhões de pessoas e representando uma resposta ao unilateralismo.
No tema ambiental, Lula mencionou a COP30 que será realizada na Amazônia. Ele propôs o conceito de que as florestas tropicais devem valer “mais em pé do que derrubadas”, citando o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre como solução inovadora. O presidente ressaltou, ainda, que a região possui um potencial de energia limpa para acelerar a redução da dependência de combustíveis fósseis.
Por fim, Lula defendeu a promoção da igualdade de gênero e a superação do trabalho de cuidado não remunerado. Ele sugeriu que é o momento de ter uma latino-americana no cargo de Secretária-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Veja discurso completo:
“Quero saudar o trabalho da Colômbia e da União Europeia pela realização desta Quarta Cúpula birregional. Desejo igualmente expressar minhas condolências às vítimas das tempestades que atingiram recentemente o Caribe e o estado do Paraná, na região Sul do Brasil. Nossos pensamentos e orações estão com todas as vítimas e seus familiares.
A CELAC e a União Europeia são centrais para a construção de uma ordem mundial baseada na paz, no multilateralismo, e na multipolaridade. Há dois anos, quando nos reunimos em Bruxelas pela última vez, vivíamos um momento de relançamento dessa histórica parceria. Desde então, experimentamos situações de retrocesso.
A América Latina e o Caribe vivem uma profunda crise em seu projeto de integração. Voltamos a ser uma região balcanizada e dividida, mais voltada para fora do que para si própria.
A intolerância ganha força e vem impedindo que diferentes pontos de vista possam se sentar à mesma mesa. Voltamos a conviver com as ameaças do extremismo político, da manipulação da informação e do crime organizado.
Projetos pessoais de apego ao poder solapam a democracia. Estamos deixando de cultivar nossa vocação de cooperação e permitindo que conflitos e disputas ideológicas se imponham.
Como resultado, vivemos de reunião em reunião, repletas de ideias e iniciativas que muitas vezes não saem do papel. Nossas Cúpulas se tornaram um ritual vazio, dos quais se ausentam os principais líderes regionais.
A guerra no coração da Europa segue semeando a incerteza e canaliza para fins bélicos recursos até então essenciais para o desenvolvimento justo e sustentável que sonhamos. A ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e do Caribe. Velhas manobras retóricas são recicladas para justiçar intervenções ilegais.
Somos uma região de paz e queremos permanecer em paz. Democracias não combatem o crime violando o direito internacional. A democracia também sucumbe quando o crime corrompe as instituições, esvazia os espaços públicos, destrói famílias e desestrutura negócios.
A segurança é um dever do Estado e um direito humano fundamental. Não existe solução mágica para acabar com a criminalidade. É preciso reprimir o crime organizado e suas lideranças, estrangulando seu financiamento e rastreando e eliminando o tráfico de armas. O alcance transnacional do crime coloca à prova nossa capacidade de cooperação.
Nenhum país pode enfrentar esse desafio isoladamente. Ações coordenadas, intercâmbio de informações e operações conjuntas são fundamentais para que a gente consiga vencer. Foi com esse objetivo que renovamos o Comando Tripartite da Tríplice Fronteira, com a Argentina e o Paraguai.
Em Manaus, estabelecemos o Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia, reunindo agentes de nove países sul-americanos. Essas são plataformas permanentes de cooperação para combater crimes financeiros e o tráfico de drogas, de armas e de pessoas.
Meus amigos e minhas amigas, a COP30, que está acontecendo no coração da Amazônia, é uma oportunidade para a América Latina e o Caribe mostrarem ao mundo que conservar as florestas é cuidar do futuro do planeta.
O Fundo de Florestas Tropicais para Sempre é uma solução inovadora para que nossas florestas valham mais em pé do que derrubadas.
A transição energética é inevitável. Nossa região é fonte segura e confiável de energia limpa e pode acelerar a redução da dependência dos combustíveis fósseis.
Também temos um enorme potencial de aprofundar nossos laços econômicos. O Acordo MERCOSUL-União Europeia prova que é possível fortalecer o multilateralismo também na frente comercial.
Na próxima Cúpula do MERCOSUL, em dezembro, espero que os dois blocos possam finalmente dizer sim para o comércio internacional baseado em regras como resposta ao unilateralismo.
Com esse instrumento, integraremos duas das maiores áreas de livre comércio do mundo para formar um mercado de 718 milhões de pessoas e PIB de 22 trilhões de dólares.
Novas cadeias produtivas resilientes podem reverter o papel da América Latina e o Caribe de fornecer matéria-prima e mão-de-obra barata para o mundo desenvolvido.
Somos duas regiões pioneiras na promoção da igualdade de gênero. Podemos abrir o caminho para a superação do trabalho invisível e não remunerado das tarefas de cuidado, que recaem de forma desproporcional sobre as mulheres. Mulheres que, apesar de representarem mais da metade da população mundial, nunca exerceram a mais alta função das Nações Unidas. É chegada a hora de ter uma latino-americana no cargo de Secretária-Geral da ONU.
Precisamos enviar ao mundo um sinal de que duas regiões estratégicas como América Latina e Caribe e a Europa estão comprometidas com uma agenda promissora.
Uma agenda de paz, cooperação, ampliação do comércio e dos investimentos, geração de empregos e crescimento sustentável. Fatores essenciais para construir um futuro inclusivo e repleto de oportunidades.
Muito obrigado”.

