EUA: inflação acelera para 3% em setembro, a 4 dias de reunião do Fed
A inflação nos Estados Unidos em setembro deste ano teve uma ligeira aceleração em relação ao mês anterior, mas ainda veio dentro da estimativa dos analistas do mercado, de acordo com dados divulgados nesta sexta-feira (24/10) pelo Departamento do Trabalho.
O que aconteceu
- O Índice de Preços ao Consumidor nos EUA (CPI, na sigla em inglês), que mede a inflação no país, ficou em 3% em setembro, na base anual, ante 2,9% registrados em agosto.
- Na comparação mensal, o índice foi de 0,3%, ante 0,4% do mês anterior.
- Os resultados da inflação nos EUA vieram praticamente em linha com os prognósticos do mercado. A média das estimativas era de 3,1% (anual) e 0,4% (mensal).
- A meta de inflação nos EUA é de 2% ao ano. Embora não estivesse nesse patamar, o índice vinha se mantendo abaixo de 3% desde julho de 2024.
Fed vai definir juros na semana que vem
Em sua última reunião, nos dias 16 e 17 de setembro, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve (Fed, o Banco Central norte-americano) anunciou o corte de 0,25 ponto percentual na taxa de juros, que passou a se situar no intervalo de 4% a 4,25% ao ano.
Foi o primeiro corte de juros feito pela autoridade monetária norte-americana em 2025.
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EUA: diretora do Fed projeta mais 2 cortes de juros até o fim do ano
A próxima reunião do Fed para definir a taxa de juros acontece na semana que vem, nos dias 28 e 29. Apesar de a inflação ter acelerado em setembro, a expectativa majoritária do mercado é por mais dois cortes de 0,25 ponto percentual nos juros até o fim deste ano.
A taxa básica de juros é o principal instrumento dos bancos centrais para controlar a inflação. Quando a autoridade monetária mantém os juros elevados, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
Uma nova queda da taxa de juros norte-americana teria forte impacto na economia global. Ela tende a reduzir a pressão sobre o dólar, baixando a cotação da moeda americana frente a outras moedas. Também torna mais atrativos os ativos de renda variável – e, portanto, de maior risco –, como as ações negociadas em bolsa.
Powell alerta para inflação resiliente
Há dez dias, em discurso durante o encontro anual da Associação Nacional de Economia Empresarial (Nabe, na sigla em inglês), o presidente do Fed, Jerome Powell, desafeto de Donald Trump, já havia afirmado que a inflação no país continua acima da meta e exigindo cuidado por parte da autoridade monetária.
No evento, Powell disse ainda que “há risco de que o lento repasse das tarifas comerciais comece a parecer uma inflação persistente”, o que exigiria cautela do BC norte-americano.
Ainda segundo o presidente do Fed, o mercado de trabalho nos EUA “está mostrando riscos negativos bem significativos”, com claros sinais de desaceleração na criação de vagas e uma demanda por mão de obra “se movendo um pouco mais rápido do que a oferta”. “Se agirmos muito rapidamente, podemos deixar o trabalho contra a inflação inacabado”, alertou Powell.
O chefe do BC dos EUA afirmou também que o objetivo da autoridade monetária é levar a inflação de volta à meta de 2% ao ano, “sem causar danos desnecessários ao emprego”. “Nossas decisões são tomadas reunião a reunião, com base na evolução dos dados e no balanço de riscos entre crescimento, emprego e preços”, explicou.
Análise
Segundo André Valério, economista sênior do Banco Inter, o resultado da inflação nos EUA sugere uma continuidade da tendência observada nos últimos meses. “Os efeitos das tarifas se mostram presentes, com a inflação de bens mantendo tendência de aceleração, com o núcleo da inflação de bens registrando alta de 1,54% nos últimos 12 meses, ante deflação de 0,53% em dezembro. Entretanto, essa alta tem sido compensada pela desinflação de serviços, que registra alta de 3,47% nos últimos 12 meses, ante alta de 4,41% em dezembro de 2024”, observa.
“De todo modo, devido ao ‘shutdown’ do governo americano, é difícil contextualizar esse resultado sem outras estatísticas econômicas. A nossa expectativa é que o ‘shutdown’, na margem, seja uma fonte de desaceleração da economia, especialmente se a duração superar 30 dias. Assim, esperamos que o Fed corte a taxa de juros na reunião da próxima semana em 25 pontos-base, repetindo a dose na reunião de dezembro”, avalia o economista.
Em relação ao Fed, Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad, avalia que “as incertezas mais agudas ficam em torno da reunião de dezembro, para a qual não há consenso sobre os movimentos do Fed e, provavelmente, faltarão dados para embasar uma decisão”. “Mesmo com o fim do ‘shutdown’, os dados apresentados para outubro podem não ser tão confiáveis, com efeitos de maiores dificuldades na coleta, processamento e divulgação”, afirma.
Ariane Benedito , economista-chefe do PicPay, destaca que “o núcleo da inflação, que exclui os componentes voláteis de alimentos e energia, também registrou alta de 0,2% no mês, mantendo o mesmo ritmo de agosto, e acumula 3% em 12 meses, o que demonstra que a trajetória de desinflação segue presente, mas ainda incompleta”.
“O comportamento do núcleo, especialmente em serviços, indica que a demanda doméstica permanece sólida, sustentada por um mercado de trabalho aquecido e crescimento moderado dos salários. Dessa forma, apesar das nossas expectativas seguirem o mercado com dois cortes de 0,25% ainda este ano, o dado consolida a expectativa de que o Fed deve continuar preservando uma postura cautelosa até que os sinais de enfraquecimento da inflação de serviços se tornem mais evidentes”, conclui.
Felipe Salles, economista do C6 Bank, por sua vez, afirma que “os dados da inflação americana vieram abaixo do esperado para setembro, mas com uma composição ligeiramente ruim”. “Ao analisar o núcleo do CPI, que exclui energia e alimentos, vemos que houve alta nos preços de bens industriais (0,2%), impulsionada principalmente por segmentos como vestuário (0,7%) e móveis (0,2%). Já os preços de serviços subiram 0,2% no mês, pressionados por serviços médicos (0,3%) e serviços de transporte (0,3%)”, observa.
“Os números do CPI de setembro mostram que a inflação americana continua elevada, com altas persistentes no setor de serviços, e acima da meta de 2% definida pelo Fed. Nossa expectativa é a de que o aumento de tarifas de importação imposto pelo governo americano tenha impacto sobre os preços de bens nos próximos meses, o que deve manter a inflação americana pressionada”, prossegue Salles.
“A paralisação do governo dos EUA tem afetado a divulgação de indicadores econômicos, o que prejudica a análise do cenário atual pelo Fed. Esse contexto, somado à inflação elevada e acima da meta, deveria manter a autoridade monetária cautelosa em relação aos próximos passos. No entanto, para a reunião da semana que vem, reconhecemos que um corte de juros é o cenário mais provável, considerando que os membros do Fed têm demonstrado uma preocupação maior com uma possível deterioração do mercado de trabalho do que com a inflação.”

