Tarifaço contra o Brasil foi um “tiro no pé” de Trump? Entenda

Tarifaço contra o Brasil foi um “tiro no pé” de Trump? Entenda

Há quase dois meses das tarifas de 50% sancionadas pelo presidente do Estados Unidos, Donald Trump, ao Brasil e a vários países no mundo, especialistas avaliam se o tarifaço pode ter sido um “tiro no pé” do chefe da Casa Branca.

Para o professor de finanças da Strong Business School, Jarbas Thaunahy, afirmar que as sanções foram um tiro no pé simplifica demais o cenário. “Creio que seja mais prudente afirmar que contribuíram para pressionar os preços domésticos, mas eles não são a causa única, o efeito líquido agravará a inflação alimentar em um momento de outro choque, reforçando a percepção de um custo político interno das medidas tomadas”, disse ele.

Os dados mostram que esse cenário já pode ser percebido pelo consumidor americano, que já está sendo afetado pelas medidas de Trump e está pagando mais caro em produtos brasileiros, como café e carne bovina.

Segundo o Índice de Preços ao Consumidor dos EUA, responsável por medir a inflação no país, o preço do café cresceu 21% no acumulado de 12 meses, sendo 3,6% somente na passagem de julho para agosto, a maior taxa em 28 anos.

Já a carne bovina teve aumento de 7,3% no ano, sendo 1,8% entre julho e agosto. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), as exportações para os EUA tiveram queda de 51,1% em relação ao mês de agosto do ano passado, saindo de 19,1 mil toneladas embarcadas para 9,3 mil toneladas.

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Entenda o contexto das tarifas de Trump

Em abril, o chefe da Casa Branca impôs tarifas de 10% a produtos brasileiros e no começo de julho Trump anunciou uma taxa extra de 40%, totalizando tarifas de 50% para as exportações do país, sob justificativa de que o Brasil é superavitário nas relações comerciais com os EUA, quando, na verdade, o país é deficitário na balança comercial.

  • Superávit é quando um país vende mais do que compra, déficit é quando acontece o contrário.

Outra justificativa dada pela Casa Branca foi o processo judicial contra do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o qual Trump chamou de “caça as bruxas” feita pelo Judiciário brasileiro. Bolsonaro foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de estado. Antes disso, ele já estava em prisão domiciliar por outro caso.

Desde o anuncio do tarifaço, o governo brasileiro tem tentado negociar a diminuição das taxas com o governo americano, no entanto, as tentativas foram atrapalhadas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL/SP), filho do ex-presidente.

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Impacto das tarifas nos EUA

Além do impacto no bolso dos americanos, devido a preços mais altos, os especialistas projetam uma possível desaceleração da economia americana em decorrência das tarifas sancionadas pelo governo.

Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em seu relatório mais recente, a economia americana desacelerará para 1,8% em 2025, acima dos 1,6% estimados em junho, após ter crescido 2,8% no ano passado.

Para o secretário-geral da OCDE, os efeitos do tarifaço ainda levarão mais tempo para serem sentidos. “Os efeitos completos dessas tarifas ficarão mais claros à medida que as empresas reduzirem os estoques acumulados em resposta aos anúncios das tarifas e à medida que as tarifas mais altas continuarem sendo implementadas”, disse em entrevista coletiva.

Referente ao custo político citado pelo professor Jarbas Thaunahy, um grupo de cinco senadores apresentou uma resolução para cancelar as tarifas impostas por Trump sob a justificativa de que as taxas ameaça os setores da economia americana. Entre os senadores que apresentaram a proposta, estão 4 democratas e 1 republicano, que é o partido de Trump. Segundo os parlamentares, o presidente está promovendo uma guerra comercial entre os países, mas sem interesses econômicos, apenas políticos.

Além disso, as pesquisas promovidas sobre o assunto mostram que mais da metade dos americanos é contra as tarifas impostas por Trump, o que pode representar queda na sua popularidade e dificuldades na hora de tentar eleger um aliado republicano.

Para o economista chefe da Blue3 Investimentos, Roberto Simioni, mesmo com a proteção temporária de indústrias locais, a elevação nos custos de insumos tende a encarecer o custo de vida e fragilizar cadeias produtivas que dependem da complementaridade internacional.

“No plano institucional, essa inflexão tarifária representa um desafio à estabilidade das relações comerciais multilaterais. Sob a perspectiva do protecionismo, as tarifas funcionam como barreiras comerciais para proteger indústrias domésticas da concorrência externa”, avaliou.

Ele disse ainda que essa tipo de política traz efeitos adversos consideráveis, como o aumento de preços ao consumidor, a elevação de custos para empresas americanas que dependem de insumos brasileiros e a deterioração da eficiência produtiva.

Política de desvalorização do dólar

Analistas do mercado financeiro afirmam que a política de tarifas de Trump tem o objetivo de desvalorizar o dólar, que está em patamar elevado e pressiona a inflação e aumenta o déficit comercial que os EUA possuem com outros países.

Além disso, desde a campanha pela sua reeleição, Trump defende o aumento da industrialização no país, o que é dificultado pela valorização do dólar, já que quanto mais alto, mais caro fica para empresas investirem no país.

O professor Thaunahy explica que, do lado do comércio, as tarifas encarecem importações e reduzem a saída de dólares, o que a rigor tenderia a valorizar a moeda americana. Já pelo lado financeiro, medidas protecionistas geram incerteza, além de reduzirem confiança de investidores estrangeiros e podem provocar fuga de capitais, o que é um fator que pressiona o dólar para baixo.

“O que se vê nos últimos meses é uma ambiguidade na prática. Ao longo de 2025, tivemos anúncios de novas tarifas pelo governo dos Estados Unidos, provocando impacto imediato depreciação do dólar em relação ao euro e até ao iene [moeda oficial japonesa], segundo o levantamento de mercado justamente pela percepção de risco e menor atratividade de ativos americanos”, explicou.

O real também se valorizou com relação ao dólar, fechando a semana em R$ 5,35 ante aos R$ 5,44 registrados no primeiro dia do mês. No acumulado do ano, a moeda americana já apresenta perda de 14,25% em relação ao real.

Porém, Thaunahy alerta que a estratégia unilateral pode render ganhos geopolíticos de curto prazo, mas enfraquece a influência institucional dos EUA no longo prazo, gera fragmentação do comércio global e acelera a busca por alternativas ao sistema centrado no dólar.

Presidentes americanos que já tentaram desvalorizar o dólar:

  • Presidente Richard Nixon, em 1971, quando encerrou a conversão do dólar em ouro para demais países. Resultado: aumento de inflação e alta da taxa de juros;
  • Presidente Ronald Reagan, em 1985, quando firmou o Acordo de Plaza, que reunia Alemanha, Japão, Reino Unido, Canadá e França para enfraquecer o dólar. Resultado: déficit fiscal;
  • Presidente Barack Obama, em 2009, quando tentou que a China valorizasse o yuan, moeda oficial chinesa. Resultado: aumento da inflação.

Aceno ao fim do tarifaço

No começo da semana, Trump discursou na abertura da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e fez um aceno a uma possível reunião com Lula. De acordo com o americano, os presidentes se encontraram rapidamente, mas Trump concordou que os dois tem assuntos a resolver. “Tivemos uma excelente química”, disse.

A equipe do governo lula comemorou a fala de Trump e tem expectativas de que uma reunião, online ou via telefone, aconteça nas próximas semanas.

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